Por Roberto Kuppê (*)
Eu achava muito incômodo alguém dizer que não tinha mãe. Eu me achava privilegiado por ter uma mãe de 93 anos. “Quase 100”. E agora estou me arrumando para ir à missa de sétimo dia da morte dela, embora façam só cinco dias. Não seria missa de quinto dia?
Eu estou achando estranho dizer que minha mãe morreu. Para mim ela está viva. Presente. Não a vejo fora deste plano. Nos últimos anos, meses e dias quase não desgrudei dela. Fazia questão de estar bem junto dela quando a visitava. Ela morava numa casa e eu, num apartamento a uns seis quilômetros de distância.
Nos últimos dias a visitei com mais frequência. Dormi no hospital algumas vezes. No velório dela fiquei só eu e ela, das 21h às 8 da manhã. O cemitério é longe, a 30 quilômetros de nossas casas. Eu me voluntariei a ficar literalmente velando a minha mãe.
Na mesma noite estava sendo velado na capela ao lado um senhor de 58 anos. Quase a metade da idade da minha mãe. Morreu novo, de complicações da diabetes, após passar seis anos acamado.
Eu sempre achei que minha mãe estava vivendo muito. Mas queria que chegasse aos 100 anos, isso em 2032. Não chegou. Ainda bem, prá ela que estava bastante debilitada.
Só tenho boas lembranças dela. Já demos boas risadas juntos. Teve um dia que rimos tanto que acho que fizemos xixi. Risos. Foi um dia quando havia futebol em Porto Velho. Copão da Amazônia! Década de 70 (1975). Nós fomos ao estádio Aluízio Ferreira vender laranjada. Meu irmão Chiquinho (que Deus o tenha) foi quem preparou. Eu, meus irmãos e minha mãe fomos ao estádio vender.
Estou escrevendo e rindo…kkkk….sabe o que aconteceu? Meu irmão bateu as laranjas no liquidificador com algumas sementes. A laranjada ficou amarga. Quem bebia fazia uma cara de quem estava chupando limão. Resultado. Voltamos pra casa com toda a laranjada azeda. Rindo do estádio até em casa. Foi um dia inesquecível.
No geral, minha mãe era contida, na dela. Quase não se expressava. Nunca foi de bater papo com vizinhos. Nunca brigou com ninguém. Nunca teve nenhum atrito com nenhuma pessoa. Nunca gritava em casa, nem quando tinha razão. E como tinha razão.
Certo dia pediu para eu não sair prá balada. Eu tinha 25 anos, em 1985, logo após retornar do Rock in Rio. Sai com o Fiat 137 cheio de whisky no carro para um aniversário de 15 anos perto 5o BEC, em Porto Velho. No meio da festa fui deixar uma pessoa e voltaria para a festa. Foi ao descer a ladeira da Rogério Weber (perto da 7 de Setembro) que o Fiat 137 perdeu o controle e capotou seis vezes. Saí com a mão esquerda estraçalhada. Perdi um dedo, o polegar esquerdo. Escapei com vida.
Se eu tivesse ouvido a minha mãe…
(*) Roberto Kuppê é jornalista e articulista político e…sem pai e mãe!


