Originário da Amazônia, o tambaqui virou commodity global: China lidera a produção em escala industrial enquanto o Brasil domina genética e tecnologia da espécie.
Durante décadas, o tambaqui foi visto como um peixe tipicamente brasileiro. Nativo da bacia amazônica, símbolo da pesca e da piscicultura do Norte do país, ele ganhou espaço em viveiros escavados, feiras regionais e no prato do consumidor nacional. O que pouca gente percebeu é que, silenciosamente, esse peixe amazônico cruzou oceanos e passou a ser produzido em larga escala na Ásia. Hoje, a China ocupa a liderança mundial na produção e exportação de tambaqui, enquanto o Brasil, embora continue estratégico, ficou para trás em volume absoluto.
Essa mudança não aconteceu por acaso. Ela é resultado direto de planejamento industrial, adaptação genética, domínio de escala e integração com cadeias globais de proteína aquática. O tambaqui deixou de ser apenas um peixe regional para se tornar uma commodity aquícola internacional, com protagonismo chinês.
O que é o tambaqui e por que ele se tornou tão atraente para a aquicultura global
O tambaqui (Colossoma macropomum) é um peixe de água doce conhecido por seu crescimento rápido, rusticidade, excelente conversão alimentar e carne branca apreciada. Ele tolera variações de oxigênio, adapta-se bem a sistemas intensivos e alcança pesos comerciais elevados em ciclos relativamente curtos.
Essas características chamaram a atenção de países com tradição em aquicultura intensiva. Para a China, que busca constantemente espécies eficientes para abastecer seu gigantesco mercado interno e exportações, o tambaqui se encaixou perfeitamente no modelo industrial.
Como a China assumiu a liderança mundial na produção de tambaqui
A China incorporou o tambaqui à sua matriz aquícola a partir de programas de introdução controlada, melhoramento genético e adaptação a sistemas de cultivo intensivo. Em pouco tempo, o peixe passou a ser criado em tanques escavados, sistemas semi-intensivos e estruturas altamente tecnificadas.
- O diferencial chinês não foi apenas biológico, mas industrial. O país opera com:
- produção em larga escala,
- cadeias logísticas integradas,
- processamento industrial de filés e produtos congelados,
- capacidade de exportação contínua.
Com isso, a China ultrapassou o Brasil em volume total produzido, transformando o tambaqui em mais um item do seu portfólio de proteína aquática.
Brasil: berço da espécie, mas não da maior escala
Embora não lidere mais o ranking global em volume, o Brasil segue como referência técnica, genética e científica do tambaqui. O país concentra os principais bancos genéticos da espécie, domina as técnicas de reprodução induzida, larvicultura e engorda em clima tropical.
Além disso, o consumo brasileiro é majoritariamente interno. Diferente da China, que produz pensando em escala e exportação, o Brasil direciona grande parte da produção para mercados regionais e nacionais, especialmente Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
Isso cria um paradoxo: o peixe nasceu na Amazônia, mas hoje é produzido em maior volume fora dela.
Genética, pesquisa e domínio tecnológico brasileiro
Universidades, centros de pesquisa e empresas brasileiras foram responsáveis por avanços decisivos no cultivo do tambaqui. Técnicas de reprodução artificial, controle sanitário e seleção genética surgiram no Brasil antes de serem adotadas em outros países.
Na prática, isso significa que boa parte do conhecimento usado hoje na Ásia tem origem em pesquisas desenvolvidas no próprio território brasileiro. O país não perdeu relevância; perdeu escala industrial.
Diferença de modelo: commodity global versus mercado regional
A principal diferença entre Brasil e China não está na capacidade técnica, mas no modelo econômico. Enquanto a China trata o tambaqui como commodity global, o Brasil ainda o encara, em grande medida, como peixe regional.
Na China, o tambaqui entra em linhas industriais de processamento, congelamento e exportação. No Brasil, ele ainda é muito associado ao consumo fresco, feiras locais e mercados regionais, o que limita volumes e padronização.
Impacto no comércio internacional de peixes
Com a liderança chinesa, o tambaqui passou a competir em mercados internacionais com outras espécies de cultivo, como tilápia e pangasius. Seu custo competitivo e perfil nutricional fizeram dele uma alternativa interessante para países importadores de proteína aquática.
Esse movimento reforça a tendência de globalização de espécies antes consideradas “locais”. O tambaqui deixou de ser apenas amazônico para integrar o mercado mundial de pescado cultivado.
O que o caso do tambaqui revela sobre a aquicultura mundial
A trajetória do tambaqui é um exemplo claro de como origem biológica não garante liderança produtiva. Em aquicultura moderna, vence quem domina escala, logística, processamento e mercado internacional.
A China aplicou ao tambaqui a mesma lógica que já havia usado com outras espécies: industrialização, padronização e expansão contínua. O resultado foi a liderança em volume.
Brasil pode retomar protagonismo em volume?
Tecnicamente, sim. O Brasil possui clima, água, conhecimento e área disponíveis para expandir a produção. O desafio está em investir em escala, integração industrial e acesso a mercados externos.
Caso o país avance nesse sentido, pode disputar novamente posições no ranking global. Caso contrário, seguirá como referência técnica, mas não como maior produtor.
Um peixe amazônico que se tornou símbolo da globalização alimentar
O tambaqui é hoje um símbolo claro da globalização da produção de alimentos. Ele nasce na Amazônia, é pesquisado no Brasil, produzido em massa na China e consumido em diferentes partes do mundo.
Essa trajetória mostra que, na aquicultura moderna, a geografia de origem importa menos do que a capacidade de produzir em escala sustentável.
A liderança em volume não é tudo, mas muda o jogo
A China lidera a produção mundial de tambaqui em volume, enquanto o Brasil mantém o domínio genético e tecnológico da espécie. São protagonismos diferentes, mas com impactos distintos no mercado global.
O peixe amazônico entrou definitivamente no radar da aquicultura mundial. E sua história mostra que, no século XXI, quem transforma conhecimento em escala assume a dianteira — mesmo quando a espécie nasceu do outro lado do planeta.
Fonte: Click petroleo e gas



