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quarta-feira, dezembro 11, 2024

O fascismo está vivo

Vinício Carrilho Martinez (*)

Engana-se quem acha que o fascismo está extinto; pelo contrário, não só está vivo como é manifesto (nada disso de ser latente). O fascismo se regenera todos os dias e se não combatermos com vigor a ameaça pode se tornar uma realidade de poder, outra vez.

O fascismo está presente em quem organiza e participa de um rolezinho com 500 motos, andando a toda velocidade e na contramão de importantes avenidas de grandes cidades, colocando em risco a vida de pessoas inocentes e apenas para desafiar a regra social.

O fascismo está nos assaltos, roubos, depredações, intimidações e atentados à vida praticados pelos grupos de Black Blocs; porém, o fascismo também é visível e atuante na segregação praticada por alguns shoppings, ao impedir o acesso de jovens pobres e negros ao seu estabelecimento. Aliás, o racismo é crime hediondo.

O fascismo está em lançar um foguete de alto impacto na cabeça de um cinegrafista da Band, no Rio, levando-o à morte com afundamento de crânio. No mesmo sentido, o que dizer de uma apresentadora de televisão no jornalismo de horário nobre, em cadeia nacional, pregar a violência e o linchamento público de um jovem infrator de 15 anos?

É óbvio que o jovem não é tão criança assim que não soubesse das implicações morais e penais dos atos criminosos que vinha praticando, mas é ainda mais evidente que a atitude da apresentadora do SBT -Rachel Sheherazade- deveria ser qualificada como pregação racista, preconceituosa, apologia ao crime e atentado à ordem jurídica democrática. Em país sério, em que a violência é muito menor do que a que experimentamos no Brasil (e sem que os jornalistas precisem fomentar ainda mais), esta emissora de TV seria seriamente advertida e até poderia perder a concessão pública, caso incorresse em reincidência.

Nesta semana, um dos nomes mais falados na internet e na política foi o de Rachel Sheherazade. Tudo porque a apresentadora do jornal “SBT Brasil” emitiu uma opinião na última terça-feira (04) sobre um jovem de 15 anos, acusado de roubo, que foi agredido e acorrentado por populares no Rio de Janeiro. Para a âncora, em um país onde há grandes índices de violência, as atitudes dos chamados vingadores são consideradas compreensíveis. A jornalista ainda classificou o fato como uma “legítima defesa coletiva de uma sociedade sem Estado” e incentivou que os defensores dos direitos humanos fizessem um “favor” ao Brasil e adotassem um bandido[1].

A apresentadora apresenta seus bordões ora em histeria ora bastante histriônica. Neste episódio, há clara incitação ao ódio social, sobretudo se verificarmos que se trata de jovem muito pobre e que a “jornalista” não apelou para uma caçada aos bandidos reais de colarinho branco e que tanto acossam o Estado e a sociedade brasileira.

Os mais afoitos ou liberais destemidos logo perguntariam se cabe censura nesses casos: como, a censura não é antidemocrática? Preliminarmente, cabe dizer que apenas a censura contra atos democráticos é antidemocrática. No entanto, a censura aos atos antidemocráticos é profundamente democrática.

Trata-se da chamada intolerância positiva, quando não-toleramos o que é intolerante (exatamente o fascismo) para, democraticamente, promover tudo o que pode ser tolerado (a começar da democracia).

Muitas vezes, a tolerância negativa (não-combater o fascismo) é o fim da tolerância positiva (democracia); portanto, em outros casos, a intolerância positiva (censura à antidemocracia) é o início do combate à intolerância negativa (preconceito, racismo, fascismo). A lição é bíblica: “Basta-nos nada fazer, para que o Mal prospere”.

Enfim, não há nenhuma semelhança com o conto Mil e uma noites, em que a jovem donzela, bela e sábia, atuou contra o despotismo do Rei da Pérsia. Até mesmo porque aquela jovem chamava-se Sherazade.

(*) Vinício Carrilho Martinez

Professor Adjunto III da Universidade Federal de Rondônia – UFRO, junto ao Departamento de Ciências Jurídicas/DCJ. Pós-Doutor em Educação e em Ciências Sociais e Doutor pela Universidade de São Paulo. Bacharel em Ciências e em Direito, é jornalista.

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