Por Samuel Costa
Advogado Criminalista e Professor
A prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, reacendeu debates jurídicos e políticos no país e, sobretudo, expôs um problema ainda mais grave que a própria polarização: a propagação de interpretações deturpadas, incompletas e falseadas sobre os fatos.
Em Rondônia, o deputado federal Fernando Máximo (UB), pré-candidato ao Governo, tornou-se símbolo desse fenômeno ao conceder declarações que ignoram premissas básicas do Direito Penal e do Direito Constitucional, reduzindo um caso complexo a analogias frágeis e juridicamente desastrosas.
Em entrevista ao site Folha do Sul Oline, Máximo afirmou ter consultado advogados que lhe garantiram que a suposta tentativa de golpe “não configura crime” no Brasil, comparando o episódio a alguém que planeja um assalto a banco e não o realiza. Segundo ele, Bolsonaro sequer poderia ter sido denunciado. Trata-se de um raciocínio tecnicamente inapto, que ignora conceitos como atos preparatórios qualificados, atentado ao Estado Democrático de Direito, obstrução de investigação e reiterado descumprimento de medidas judiciais.
A distorção se torna ainda mais evidente quando o deputado ironiza: “Bolsonaro é um homem de 70 anos, que já passou por 7 cirurgias e está soluçando há um mês. Que perigo ele representa?” O perigo da prisão preventiva não é físico, mas processual. Não se trata de força corporal, mas de risco de fuga, destruição de provas ou obstrução da investigação. É exatamente isso que fundamenta a decisão judicial, e não uma suposta ameaça física a terceiros.
Além disso, Máximo classificou como “absurda” a condenação eleitoral de Bolsonaro por abuso de poder político ao reunir embaixadores para atacar o sistema eleitoral. A afirmação ignora que a decisão foi colegiada, fundamentada e submetida ao devido processo legal. Esse tipo de discurso, apoiado em frases de efeito e não em técnica jurídica, confunde a população e tenta reduzir decisões complexas a slogans de palanque.
A aberração que ocorre em Rondônia: quando o Estado prende e simplesmente esquece
Enquanto isso, no próprio estado do deputado, outra distorção grave do sistema de Justiça expõe a fragilidade do controle judicial. Um flagrante forjado resultou na conversão automática em prisão preventiva, sem fundamentação concreta, violando o artigo 312 do Código de Processo Penal. Em seguida, após um despacho auricular com um Desembargador, houve declínio de competência. O processo foi redistribuído e, desde então, permanece em silêncio absoluto.
40 dias transcorreram sem uma única decisão para manter ou revogar a prisão. Um cidadão continua encarcerado por omissão estatal. Esse é o retrato mais fiel da mutação teratológica da prisão preventiva no Brasil. O que deveria ser medida cautelar excepcional se transforma em pena antecipada, mantida não pela lei, mas pela inércia institucional.
Quando a desinformação encontra a omissão, quem perde é a Justiça
O discurso irresponsável de agentes públicos, como o apresentado por Fernando Máximo, somado à omissão institucional em casos como o de Rondônia, cria um ambiente em que garantias constitucionais são relativizadas, decisões judiciais são distorcidas e a opinião pública é manipulada por analogias equivocadas.
Um país que aceita prisões sem decisão e que se contenta com explicações simplistas para fatos complexos é um país que normaliza o abuso estatal. Prisão sem decisão é crime de Estado. E desinformação apresentada como opinião técnica também é uma forma de violência institucional.
Samuel Costa Menezes é Rondoniense, Advogado Criminalista, Professor e Especialista em Ciência Política


